O povo tem sua concepção própria de justiça como a distribuição eqüitativa de direitos. “O direito de um termina onde começa o de outrem” – dizem, com freqüência. Essa conotação acha-se arraigada no espírito das massas e representa no contexto social o ponto de equilíbrio entre o que julgam justo e injusto, legal e ilegal, certo ou errado, amoral e imoral.
O estado, reconhecendo a necessidade de ir ao encontro a este anseio, e, por medida de segurança e paz social, criou seu mecanismo de distribuição de justiça a fim de compor conflitos que não lhe interessam e tem assim sua concepção burocrática de “fazer justiça”.
Só que, como tudo burocrático, esta se faz lenta e gradual, para não se dizer estritamente “lerda”.
Já se disse que a justiça é lenta porque tem de ser formal!…
O que assistimos em quase todo o país é uma lentidão “tão lerda”, tão aguçada que vai às raias do comprometimento da segurança do próprio estado, posto que, o retardamento dos processos e procedimentos traz a descrença na população e choca o seu sentimento mais puro de equitatividade, gerando violência.
A não resolução, a tempo, das contendas é fator de insegurança e fomentadora de novos conflitos. O interessante é que o centro do poder judiciário – os responsáveis imediatos pela agilização da justiça neste país sabem dessa notória constatação e, quando muito, debitam a outro poder as causas do desarranjo a que o contribuinte está adredemente subordinado.
A solução é política. O juizado de pequenas causas é uma faceta de como o problema pode ser atacado. Mas, toda solução política depende, sobretudo do debate, da aglutinação de forças, da convergência de vontades para resolver o problema no seu ponto estrutural e não superficial.
Está comprovado que pouco adianta a duplicação do número de magistrados ou de seus vencimentos para dar agilização aos processos, porque eles dependem de toda uma estrutura de serventias bem equipadas, oficiais de justiça bem treinados e pessoal de apoio, para bem cumprirem seu papel.
E, os juizes inferiores, representantes do judiciário mais próximo do povo, são os que mais amarguram com o problema da lentidão da justiça. A sociedade cobra solução dos advogados, que, cobram com veemência dos juizes e que muitas vezes não podem distribuir a contendo, uma justiça rápida com decisões boas e bem fundamentadas.
Dir-se-á que o Brasil é um complexo de necessidades: educação, saúde, justiça, saneamento básico etc. uma imensa lista de prioridades à espera de soluções ainda não encontradas. Mas a prioridade da justiça defluiu mais imediata do que muitos problemas também prioritários do povo brasileiro.
É preciso sacudir a atual estrutura do judiciário brasileiro para ver o que fica em pé após o balanço e reordená-lo antes que a convulsão social se estabeleça. A Constituição foi um passo. Mas a Constituição precisa de leis complementares e de atitudes para que possa efetivamente entrar em vigor.
Antes não se acreditava na Polícia, hoje desacredita-se enormemente da justiça queimando a imagem dos advogados, juízes (principalmente os inferiores), procuradores e promotores de justiça, defensores públicos e de quantos lidam com a Lei.
É urgente que a cúpula da justiça desça às bases para que a solução possa emergir destas e não de mais um código judiciário ou de outra Lei Orgânica ou complementar sem auscultar o povo.
Que se discuta com o povo através de suas representações mais legítimas, associações de classe, clubes de serviços, prefeituras, sindicatos, entidades religiosas as soluções possíveis e cabíveis de procedimentos adaptáveis ao nosso nível e estágio de desenvolvimento social. De que valem cópias de organizações judiciárias alienígenas se a realidade é outra, se as pessoas são outras? É necessária uma justiça tupiniquim!…
Falar só em verbas falta de verbas, má distribuição de recursos etc., é uma desculpa de quem não tem criatividade política.
A solução é democratizar a própria organização da Justiça brasileira antes que o povo faça uma GREVE GERAL contra ela. Neste dia, que esperamos não ocorra, não haverá mais justiça, pois a Instituição desmoronou!
(O autor é advogado militante na Justiça de Itaperuna-Rj)
(FONTE: Jornal do BRASIL, Itaperuna-Rj, 26-03 A 1-04-1989)